quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Segredos.

O Anjo.

Uma sala vazia.Branca, sem nada ou ninguém dentro a não ser alguém completamente contraído.
Sua pele era no mínimo similar a tal sala, como se fosse projetado para ela.

"- Deixe-me em paz, por favor."

Saía, uma voz maculada de tristeza, masculina.
Passos agora eram-se escutados, trovejantes, uma outra voz, igualmente grave foi ecoada pelo local, que aparentava não ter fim, pela ilusão de branco por todo o lado, na verdade, aquele visual macabro de onde vinha os passos parecia um Anjo Negro, porque não, um Ceifador que flutuava no igual piso embranquecido.

"- E como pretendes ficar em paz? Tentando esquecer, tentando apagar tudo que aprendeste, é isso? Ignorando o fato que sou..."

"- PÁRA! JÁ! EU TE PROÍBO!"

Interrompeu o outrora penoso rapaz, descobrindo seu rosto marfim que antes se apoiava nos braços cruzados sobre as pernas dobradas.
Seu tom era agressivo e amedrontador, seus olhos, vermelhos de, talvez, raiva que sentira agora.
O Ceifador era nada mais agora que um ser dócil, mudo pela ordem de seu dono.
Embora que, seus olhos não demonstrassem qualquer emoção, fixavam-se no jovem garoto como se esperasse algo.

"- Tu...Nunca, jamais serás algo perto de mim. Nunca serás nada. Não sairás daqui, te proíbo. "

O Ceifador se sentou, agora com a face mais serena que já alguma vez presenciei.

"- É uma lástima, sabes. Não aceitares isso. Estás te destruindo.
Já olhaste ao redor? Vê o que tu tens. Eu. Nada. Somos a mesma coisa, sabes.
E mais, tu que quiseste saber algo mais, tu quiseste saber os Segredos de algo que geração alguma poderia superar. Tu quiseste saber algo mais e agora o tens. A única coisa que tens de fazer é te aceitar.
Não é nenhum enigma, ambos sabemos disso. Estou te cuspindo a resposta."

Falou como se o garoto entendesse cada palavra que era pronunciada, e as veias que eram denotadas no pescoço desse garoto confirmavam isso. O garoto apenas ficou o encarando, como se o quisesse fazer sumir, como quisesse trocar, parar aquilo.
O ambiente branco se distorcia à medida que o garoto se concentrava no Anjo sombrio, como paisagem, o garoto fez passar imagens de várias situações, gritos de desespero eram ecoados naquele espaço, mas nenhum dos dois parecia se importar, ou até mesmo ouvir aquilo.
Agora, o ambiente era pesado, o chão era coberto com uma fina camada de algo vermelho, vermelho-sangue...Sangue.
As paredes eram escuras, cinzas, pareciam estar vivas e, pelos sussurros, perdidas.
Os lábios do tal Anjo se descolaram, por fim se pronunciando e estranhamente cessando todos os sons do ambiente.

"- Sabe tão bem quanto eu que isto para mim é neutro. Tudo isto foi criado por mim. Na verdade, por ambos. Toooodos os Seus e Eu, criamos isto. É um preço para te manter assim, com a mente sã. "

Gemidos de dor, sussurros por perdão, gritos de agonia eram quase que sentidos na alma depois que o tal ser divino falou, então se deu vez ao garoto que igualmente parou todos os lamentos.

"- Mente...Sã? SÃ? OLHA A TEU REDOR! Tu me trouxestes isto. Eu não consigo ser alguém normal, não consigo ver sem...VER! Eu só quero paz...Eu entendi a lição que me deram, eu entendi o mal que está em todos, mas...droga, não.
Me recuso a ser alguém, aliás, a ser ninguém. Me recuso a entender tudo por demais, me recuso.
Quero me cegar, quero parar, faz isto parar..."

O som ambiente agora era só preenchido com o choro desse rapaz, cujas lágrimas eram escondidas pelas suas mãos que cobriam seu rosto, o chão agora era apenas destacado por um sangue seco, não mais um camada. Uma fina chuva era sentida.

"- Existe coisas que são dadas aos que temos mais fé. Fé que não podemos perder, ou nos perder. Sei que sou bastante inaceitável para teres fé em mim, então, faz isso por Ela. "

A chuva se engrossou, o som chuvoso e familiar era reconhecido, quase que palpável de tão melancólico. Trovões eram ressoados por todo o local.

"- Eu...Mas e se eu me perder nisto, se Eu não souber como e o que fazer na situação? E se ela tiver passado por mim, sem que eu tenha visto?! Eu quero Ela, só Ela, por favor. Cansei de procurar, estou perdido, preciso dela..."

"- E vais encontrar-la."

O agora augúrio continuou.

"- Vais saber, vamos saber."

Então o pacífico Ceifador dirigiu-se ao garoto, com pequenos passos que afastavam as poças que ali eram criadas pela chuva. Seu cabelo estava encharcado e por mais que os trovões iluminassem o Ser sombrio, não se via seu rosto.
O garoto ainda relutava, mas agora olhava com um misto de confiança e tristeza, suas lágrimas eram misturadas com a chuva cadente.
Todos os Segredos que o garoto havia aprendido só o traziam clarividência sobre as coisas, uma visão diferenciada de tudo. Das pessoas.
E tudo que ele via era simplesmente desesperador. Seu coração não aguentava mais ter de ver tanta...desumanidade.
Mas ele se sentia mais confuso por interpretar um papel desses, alguém que aprendia a ser um...Humano.
Alguém que chorava e sorria em típicos momentos. Esse jovem marfim se confundia pelo simples fato de sorrir...Mas não sentir o porque de sorrir. Sorrir porque foi educado a isso, viu uma situação comum e fez uma análise quase que...fria. Despojado de qualquer "coisa". Sentimento.
E ele queria sentir...Queria poder sorrir porque nada o obrigava a sorrir a não ser a simples vontade. Queria chorar e afagar a face de quem estava em cólera, sentindo a angústia do outro.
Ele queria ser o que via ao contrário nos outros seres "humanos".
Isso lhe confundia e desesperava.
Esse Anjo prometia-lhe algo que não podia recusar. Alguém que não podia negar.
Algo que não podia, não conseguiria refutar.
Ela.
E quando tudo parecia perdido, quando tudo voltasse ao pó, Ela estaria lá.
E finalmente, depois de um longo ponderar o garoto estendeu sua frágil mão em direção ao Anjo.
O Anjo ficou estático, mas segundos depois estendeu a mão.
Quando finalmente ia tocar, apertar e ajudar aquela frágil mão, um trovão foi novamente ouvido e iluminando agora tudo.
A face do anjo...Marfim.

"- Só podemos passar isto juntos, se te aceitares. "

E com aquele raio, tudo sumiu. Restando apenas aquela tela branca, sem nada para indicar seu começo ou final.
Seu nome era........


Uma sala vazia.
Branca, sem nada ou ninguém dentro a não ser alguém completamente contraído...






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