quinta-feira, 30 de junho de 2011

O Começo.

Parte III - Anjo.



Desta vez, não fui acordado. Desta vez uma porta fora imposta na minha frente, só podia saber que era uma porta pela luz que emanava pelas frestas e formava uma silhueta retangular em pé, à volta, tudo era escuro, sem som.
Claro, que agarrei a maçaneta e abri.
Ao abrir, uma conhecida sala. Lá estavam os personagens da "acordada" passada, Vergil agora estava com o braço no pescoço de Dante e Nero ralhando com Vergil, Dante já estava roxo com a falta de ar e então, Vergil o largou.

- Raios Vergil, quase mata seu irmão.

- Cof, cof, fraco, cof.

- Me enche o saco, desgraçado, que te arranco a cabeça na próxima vez, fica pedindo ajuda a Nero, pff.

A cena era engraçada até, tão engraçada que soltei uma risada leve, à medida que fechava a porta, se tinha de ficar ali com as mesmas pessoas, bah, que ao menos fosse divertido.

- Daaaaaee! Está com o humor melhorado hoje! Cof...

Dizia o gigante de vermelho, meio que massageando o pescoço.

- Eheh...Estou um pouco sim...Afinal esta história é bem complicadinha, mas...Não deixamos de estar presos ao mesmo destino, erhm?

- Não estamos presos, você sempre pode ficar no escuro por trás da porta, meu caro.

Dizia a figura mais seca do local, mas meio que educada.

- Sim, podemos, a questão é que sempre abrimos então...Olá.

- Esse é o espirito. Então, hoje, deseja fazer mais alguma pergunta? Sua vez está quase chegando, sabe.

De fundo, dava para ver Dante cutucando o de azul, parecia impaciente e, com um olhar mortal focado no ar, como se imaginasse algo bem...mortal?
Bem, de facto Nero tinha a maioria das respostas então, foi bombardeando com elas, queria absorver tudo.

- Mas...Todos nós conseguimos ver ele, porquê isso? Afinal ele não tem uma consciência própria?

- Tem, sim, mas a junção de todos nós é, na verdade, Ele.

-...Ele então é a entidade maior, ele é o propósito de existirmos?

- Até certo ponto, Ele nos cria para se ajudar, nós existimos como fruto de imaginação, somos situações separadas e/ou fraccionadas em pessoas, você é mais uma consciência base, onde se adapta mais ao "James".

Mas isso era ainda mais confuso, confuso a ponto de parar para processar, eu afinal tinha lembranças, tinha pessoas que me lembrava, tinha uma infância, embora quebrada assim como adolescência, adulto e...morte.
Me lembrava da poça de sangue em uma noite chuvosa. Apenas isso...

- Eu tenho lembranças...

- As quais existiram, em uma vida passada. Você tem também uma personalidade e um jeito de lidar com as coisas, assim como decisões.
Esse jeito, irá afetar James, com um ou dois pensamentos teus para com ele.
Claro que ele também pode escolher se vai te ignorar ou te ouvir, ele tem esse poder.

- Então só nos usa? Nós não temos propósito, fim?

- Bem...Lembre-se de seu lar. Seu lar tinha uma quantia razoável de dinheiro, dinheiro o qual você produzia pela quantidade de trabalho que você tinha, sua vida nesse tempo fora ser ensinado para ser usado e, mesmo assim, sem um real livre arbítrio.
Aqui você trabalha consigo mesmo e com "James", a questão é que, enquanto ele estiver vivo, você estará também, você não paga por isso, não precisa comer e você não é ensinado a isso.
Ele te deixa ser quem és e se funde a ti, claro, com suas limitações. Ninguém gosta de ser TODO um apenas. Senão simplesmente deixávamos de sentir, concorda?

Nero realmente tinha uma lábia incrível, assim como sua inteligência e magnificência com as palavras, aquilo esclarecera muita coisa e, o meu pensamento pre-formado de preso a alguém, fora transformado em agradecimento, afinal, com a visão de alguém vivo e, ainda assim pensando com sua própria cabeça era algo perto da liberdade, só que as limitações eram um pouco mais...estranhas.
Agora, Dante e Vergil lentamente paravam de brigar e se levantavam, um empurrando o outro, em direção da porta e, entrando na mesma, dava para ver eles sumindo no breu.

- Bem, agora vou indo, meu amigo. Qualquer pergunta que tenha, no futuro, estou aqui.
Mas vai aprender mais com ele.

Apontara para a tela onde passava as memórias de James, as presentes memórias. E se direcionou para a porta que, fechara à medida que entrou.

Agora, me concentrei na tela mostrava uma conversa e à medida que me concentrava na tela, conseguia sentir o que James sentia e ouvir o que diziam,assim como o próprio James, era uma conversa básica de jantar, socialização.
De vez em vez, James olhava para uma garota, mas eu conseguia sentir a fervilhação, algo imensamente forte.
Nos olhos da garota, eu podia ver alguém dentro, alguém...Aquele mesmo alguém que na conversa anterior vira.
Era estranha, lindamente estranha, será que ela me vira?
Fiz um sinal de "Olá" para ela, levantando o braço e acenando.
Após um tempo, essa figura fez a mesma coisa.
James cortava sempre a visão e, a conversa continuava.
A garota era estranhamente familiar, assim como a fisionomia da figura em seus olhos.
Ambos se despediram de seu amigo, e foram para uma praia, desta vez, conseguira sentir o que a garota sentira, era estranho distinguir, só que quando sentia isso, vinha um perfume junto, apenas assim conseguia diferenciar.
Ambos se sentaram, também e algo aconteceu.
...
...
Um breu.





O Começo.

Parte III - James.



A conversa se estendia largamente pela tarde, tarde que iria ficando noite, noite a qual Ravena e James decidiram se despedir de Lorenzo que, inevitavelmente ficara triste com a despedida de dois grandes amigos, uma mais nova que o outro.

"- Per favore! Fiquen' mais un poquito no?"

"- Não podemos Lorenzo, ainda tenho de mostrar uns lugares à tua bela dama."

Disse, preenchido com uma gostosa risada de Lorenzo, que entendera ambas as mensagens que James dera, assim como Ravena que deu um beijo e saiu na frente, orgulhosa.
James estava brincando, claro, mas a Ravena decidira que iria brincar mais um pouco com sua presa, como se não quisesse ser levada para outros lugares.

"- Ahah! Enfim, Lorenzo, grazi por tudo, quando meu dinheiro chegar da companhia, prometo que virei aqui, quem sabe com ela."

Disse, virando seu olhar para a ruiva que ainda continuava andando pela escuridão, esperando ninguém a não ser o vento que lhe batia nos cabelos, fazendo uma reação típica, o abrasar do fogo.

"- No te preocupes, Jamy, vá, vá!"

Dissera Lorenzo, o empurrando e depois cruzando os braços, vendo a cena de James aproveitando o empurrão leve para alcançar a garota aparentemente perdida.

"- Sabe, a praia que vamos é para a direita, andar para a frente não vai encurtar nosso caminho."

Dizia, com um sorriso estampado em seu semblante despreocupado.
O mesmo não se podia dizer de Ravena, que se virara para James com os braços cruzados, o fogo que seus cabelos representavam marcavam uma raiva incendiária, tão incendiaria que havia queimado a felicidade de James.

"- Você está bem? Que houve?"

Seu tom era de uma preocupação excruciante, como se estivesse realmente sofrendo com aquilo, preocupação que alimentou um lado sádico de Ravena, lado o qual ela ainda não teria acabado de mostrar, continuou com sua representação.

"- Você acha que eu sou alguma guria que você anda por ai, mostrando "uns lugares"?
Quem lhe disse que eu queria ir a esses lugares?"

Ela indagou com um certo tom de irritação na voz, James ficara confuso, ela não tinha entendido a brincadeira, pensou ele.

"- Mas...Me desculpe, Senhorita, foi uma simples brincadeira, eu queria dar um passeio com você, apenas isso, me perdoe se fui indelicado."

Após isso, a garota simplesmente sorriu, descruzou os braços e estendeu-lhe uma mão, conseguira o que queria dele.

"- Ah, ótimo então. Praia você disse?"

Dissera doce, mais doce do que tinha sido em toda a sua caminhada até agora. Deixou James confuso, mas não em o que deveria fazer, agarrou a mão da garota e beijara a palma da mesma, recomeçando a caminhar, rumo a uma praia.
A garota parecia diferente, algo em volta dela, algo que apenas James podia sentir percorria em todo seu corpo, suas feições mudaram, a seriedade foi despida completamente de seu ser, parecia a calmaria depois da tempestade.

"- Então...James, como conheceu Lorenzo?"

James pensou, na verdade, estava tentando se lembrar da primeira vez que conhecera seu "pai adotivo" dentre aquela cidade deserta e, logo se pronunciou.

"- Hm...Lorenzo era mais um fã meu, um fã que me reconheceu quando eu almocei em seu restaurante, de princípio era meio tímido, suas palavras eram bem calculadas, nada exagerado, bem minimalista.
Mas à medida que íamos comendo, a conversa ia ficando mais e mais agradável, ao ponto de conversarmos frustrações, problemas, até mesmo da vida em si.
Ambos simpatizamos um com o outro e, desde então, ele tem sido um pai para mim."

Disse, à medida que ia contraindo a face de dor ou alegria, de suas lembranças, sentimentos que eram notados por Ravena, a qual se abraçara de lado a James, após terminar sua explicação.

"- Fã? Mas você é alguma espécie de celebridade que eu não conheça?"

Ela disse, ainda abraçada e olhando para cima, enquanto James retirava um braço do abraço dela e a envolvia com esse braço direito, passando pelas costas e chegando até ao braço da garota, empurrando-a contra si, quando ouviu a palavra celebridade, riu um pouco.

"- Bem...Se você gosta de romances fictícios e/ou etéreos, sou uma celebridade sim, já se você for um crítico a favor do cepticismo comunal, ora..."

Riu imaginando a cena, realmente era odiado por críticos que não gostavam de decolar da Terra e pensar algo a mais, sua imaginação era muito grande, muito extremista.
Ela pareceu emudecer, não conhecia realmente nenhum trabalho de James.

"- Bem, nem todos podemos gostar da mesma coisa, é a lei da vida, e eu tenho uma boa imaginação mas não me deixe falar sozinho até à praia, Signora."

Ela riu levemente, tanto pela brincadeira tanto quanto o sotaque forçado de Lorenzo, ele era um personagem memorável.

"- Não é isso, é que você não parece desse tipo, não parece dos tipos "fictícios", você é bem assento no chão quando fala, bem...Cético. Apesar de ser um galã barato, claro."

A garota disse, contendo uma risada, James apenas deixou a risada que ela conteve fluir para sua boca, rindo.

"- Ahah, eu sou muito diferente de minhas obras, minha mente é bem...aberta."

"- Assim como seu gosto por mulheres, muito aberto."

"- Assim você me fere, doce Ravena. Meu gosto é bem limitado e bem especial."

Novamente a garota emudeceu, desta vez não pelas palavras de James mas sim pela paisagem, paisagem a qual fê-la largar o abraço que continha James, suas mãos foram à boca, espantada.
James ficara satisfeito com a impressão que a praia tinha dado, pôs suas mãos nos bolsos e admirou a Praia da Lua.
A praia da lua era conhecida também como a Praia de Prata, porque alguns dias, a praia parecia estar coberta por uma camada de prata, refletindo a Lua, a areia era branca, fina, tinha até mesmo um barulho característico de areia fina.
O abraço que James ainda matinha sobre a Ruiva fazia-a andar sobre a areia que mais parecia acariciar os pés, não era uma areia que incomodasse como as praias normais.

"- Aqui era uma reserva de areia para filtros de água, mas a maresia dava conta das máquinas, então, a empresa foi à falência com tanto reparo que tinham de dar, e, destruíram a fábrica, que fez esta areia fina."

Disse, de um tom poético para acariciar os ouvidos da garota e, finalmente, a voz foi lhe devolvida.

"- Isto...é lindo. Isto é simplesmente lindo..."

Dizia, à medida que abraçava novamente James, James aproveitou o abraço para descer até ao chão, sentando-se com ela do lado, ambos ficaram vendo a praia prateada.

Agora tudo parecia diferente, a garota que ele tivera se defendendo abrira as suas próprias defesas, defesas as quais ela tinha simplesmente evaporado.
Sua...alma parecia mais limpa, até, quando me abraçava transmitia exatamente o que tanto procurava, em todas as suas aventuras literais, em toda a sua infinita imaginação.
A paisagem não lhe tirava o fôlego desta vez, desta vez ele não poderia abdicar do fôlego, o aroma daquela rosa era irresistível demais, algo mais importante que o próprio oxigênio seria para um ser humano.
Ele não estava sendo um ser humano agora.
O ódio do dia-a-dia, a raiva que todos lhe davam não lhe preenchia, o tédio, a preguiça, o SER humano, não lhe perturbava.
Ali, ele estava sendo algo extraterrestre, algo que não se via em qualquer lugar, algo único que, nem sequer tinha raça. Era tão único que mais parecia...Uma pessoa só.
Tanto era, que até seu sangue era ruivo.
Mas era demais para o outrora relaxado James, sua vida de imaginação havia o anestesiado do que era a vida, o que, por um lado, era bom. Ele podia se sentir mais vivo, mais vivo que qualquer outro ser humano que se rastejava pelos confins do egoísmo e falso heroísmo, logo atrás vinham os hipócritas e os insatisfeitos.
Sua personalidade fugaz não lhe permitia sentir assim, não era natural para James.
Mas ainda assim, o coração batia mais alto, falava mais rápido que os pensamentos.
Ainda assim, ficara calado, quieto, de vez em quando, fechava e abria os olhos para se certificar que não era mais uma das suas fugas mentais, e...por ora, não era.
Então, por algumas horas, ambos ficaram ali, parados, estáticos.
...
A vida tinha lhe sido gentil, finalmente?



Seguidores